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da esperança combativa.

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Nós, que nos alimentamos de frases-feitas, que usamos o combustível das soluções milagrosas e simples, que nos distraímos com o lado bonito da existência, ficamos esmagados ao percebermos a inutilidade desta cosmovisão macia, perante o presente agreste e fatal que se tem imposto ao nosso olhar.
 
Temos andado entretidos a cultivar uma atmosfera de flores perfeitas e agradáveis, a sermos treinados para a contemplação exclusiva do belo, e isso é inútil e desadequado face às demandas dos dias de realidade sombria que encaramos.
 
Chegados aqui, começamos a perceber a vala funda que separa o discurso perfumado de positividade romântica da realidade cruel e inevitável. Destapada fica a incapacidade gritante de responder às questões que importam.
 
Estes são assim, os dias que separam o trigo do joio. Estes são os dias da falência dos discursos enganadores.
 
Inclinemos, pois, os ouvidos na direcção dos que nos estimulam à tenacidade nua e crua, para enfrentarmos o que aí vem, em vez de nos entregarmos aos que nos distraem e alimentam em ambientes de estufa que só engordam a nossa presunção.
 
A esperança também nasce na combatividade.

respirar.

Respirar é indispensável para existir. A maleita contagiosa dos últimos tempos, tem dificultado esta actividade aos que são afectados e aos que, para prevenir o contágio, adoptam medidas cuidadosas de etiqueta respiratória.

Talvez seja isso que tem atrofiado a inspiração e tem dificultado o fluir de ideias arejadas, ante o vigente clima extremado, tóxico e sombrio, que se espalha à velocidade de uma peste.

Permitamo-nos oxigenar pensamentos, juízos, certezas e razões para que sejam fontes de vida. Tornemo-nos, pois, pulmões sadios de consciência e princípios, mas também de aceitação e irmandade.

herança.

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A cultura de cancelamento é um barómetro impiedosamente revelador de que não estamos inclinados a sermos expostos ao diverso, ao contrário, à critica e à reprovação, e só valorizamos quem nos passa a mão no pêlo.
É o indicio de que nos estamos a acomodar a um reduto, a uma bolha, que é confortável, mas que se manifesta incapaz de interpretar o quadro completo. Paulatinamente, vamos causando danos irreversíveis à nossa atitude de tolerância, aceitação, respeito e amor ao próximo.
O desafio dos tempos é o ponderar sobre o que queremos deixar como HERANÇA aos que estão ao nosso redor e aos que virão depois de nós.
Tenho apreensão no que se pode tornar uma sociedade que não dá espaço à convivência em diversidade.

evidências faustosas.

És o luxo dos meus dias austeros. Isto parece redutor e à primeira vista roça o insultuoso, mas não interpretes mal: Não és um mero produto extravagante comprado a preço proibitivo, com a função de satisfazer um ego voraz ou para ser exibido como conquista. És um luxo, sim, porque é nessa categoria que me é permitido aceder a estados elevados do sentir, do fruir, do percepcionar, do apreciar. Por vezes, apenas o luxo permite aflorar o que é elegante e sofisticado, e abre as portas à exuberância da generosidade. E na órbita desse estado altivo, encontro alento para enfrentar o corriqueiro, o banal, a lentidão medíocre da existência.

ciclones extremados.

A fractura está cada vez mais exposta. Os ventos de mudança dão lugar aos ciclones extremados. É sintomático ver o zelo com que se reclama a protecção da propriedade privada, e se cala face à exploração humana bem debaixo dos nossos narizes empinados e hipócritas.
Não me venham falar das virtudes da pseudo-herança judaico-cristã da civilização europeia. Somos capazes das mesmas atrocidades dos extremismos que dizemos querer combater. A nossa jihad é pelo ego-consumismo-cristão. Os nossos atentados são mais elaborados e subtis, mas igualmente destruidores. Os nossos templos pregam mais o sucesso do cristianismo empreendedor e o bem-estar da alma, do que o incómodo revigorante que o amor ao próximo provoca no nosso conforto.
É muito difícil acreditar consistentemente num liberalismo económico que assobia para o lado, enquanto trata os trabalhadores como meras máquinas de produção industrial, e os cidadãos como consumidores estupidificados em obesidade mórbida de individualismo.
É muito difícil acreditar no cristianismo mainstream, rendido ao sucesso e que luta empenhadamente pela preservação de pseudovalores do farisaísmo, vestido de modernidade, que não são mais do que redutos de poder e domínio, negligenciando a realidade social e a justiça.
Caminhemos então, alegremente, rumo ao abismo da infra-humanidade.

momentos mágicos.

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O que é que nos faz sorrir? O que é que consegue penetrar a nossa carapaça, tal como os raios de sol por entre as folhas das árvores, e coloca em nós coloridos vislumbres de alegria? De onde vem o estímulo que faz brotar ideias e que fermento as faz prosperar? O que é, afinal, a vulnerabilidade do ser humano exposto à intempérie da vida ou à fortuna do momento mágico?

25 da Liberdade.

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O acto de cuspir no prato do que o 25 de Abril nos proporcionou resulta dos tempos de insanidade que vivemos. Sobretudo quando essa atitude parte dos bem-instalados que usufruem diariamente das regalias e benefícios que o novo regime lhes entregou. As injustiças, imperfeições e falhas de um regime democrático não são para esquecer, e devem ser cobradas, mas serão sempre preferíveis à obscuridade sanguinária e maléfica de um poder ditatorial. Viva o 25 de Abril. Viva a Democracia!

rastros.

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Aprecio conversas do tipo "todo-o-terreno". Não apenas porque tenham amplitude e abrangência tão vastas quanto o "todo-terreno" insinua. Também por serem aqueles diálogos que deixam em nós rastros, trilhos, como os dos rodados de um veículo na terra. Tanto que os seus efeitos não desaparecem com facilidade e obrigam a voltarmos à sua recordação e à reflexão. São conversas que nos sacodem violentamente, nos deixam o corpo moido, e obrigam a refazer caminhos, conceitos, convicções. E há um encantador mistério em tudo o que, vindo de outras mentes, origina estimulos intelectuais e efeitos corpóreos visíveis. Esta é para mim a mais bela interacção entre seres distintos. Aquela que gera transformação.

 

contra-natura.

Talvez ainda não tenhamos compreendido o alcance deste gesto e nos percamos em significados de espiritualidade pomposa que desembocam numa espécie de cristianismo de mercado de auto-satisfação superficial, em troca de uma qualquer obediência de rebanho.

Talvez precisemos de procurar abrigo à sombra deste acto, para finalmente entendermos que o amor pela humanidade não está nos zelos mesquinhos, nem em instaurações de reinos de dominação terrena, mas na entrega a um amor sem condições que toque o semelhante mais distante de nós.  

Toda a esperança do mundo está contida num acto